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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Do rio que tudo arrasta dizem que é violento, mas ninguém diz o quão violentas são as margens que o reprimem..

Viajamos para Maresias no Litoral Norte.
Adorou a proximidade com os avós paternos, eternos adoradores de bebês e da perfeccionista e bela, tia Carla.. 
Ele também gostou da piscina, da areia da praia, dos passeios mas, talvez não tenha gostado de alguns  "Não pode!". E quanto mais adultos por perto, mais "Não pode"..
Geralmente é um problema considerável levar bebês e crianças para passeios pois eles ainda não sabem que existe um universo polimorfo.
Agora que ele dá os primeiros passos, experimentando uma parcela de autonomia, quer segurar tudo que lhe é novo. Os brinquedinhos, todos bonitinhos, coloridos e caros, já não interessam. O interessante é pegar um relógio e derruba-lo, ou, colocar o dedinho num interruptor..Quanto mais falamos "Não pode" e balançamos o dedo indicador, mais desejos surgem pelo proibido..
Pior ainda é que temos que inicia-lo na limitação do sono. Mesmo bebês não podem fazer barulho as 2:00 h da manhã, quando outras pessoas, cansadas, precisam dormir..E essa imposição é uma das piores pois sono é como um passarinho que pousa ou não sobre um travesseiro..  
Assim, vamos limitando o caminho, os acessos e aguentamos o choro de repulsa do querer infantil.
Crianças e adolescentes (crianças que não cresceram o suficiente) sofrem no mundo conjugal. No entanto, na idade da razão, descobrirão que se não fossem os limites, 90% da humanidade não chegaria à idade adulta. Obviamente, tem adulto que limita demais e dai caímos no que Freud relacionou com histeria, ou, neuroses provenientes de "desejos reprimidos"..
Nós também fomos seres que alguém limitou e talvez o que nos fizeram foi só um treino para a limitação maior, a  da vida..Nesse corpo tudo será sempre limitado. No entanto, um dia aprenderemos a ser livres psiquicamente. Os monges já conseguem essa proeza.
Só na idade da razão é que descobriremos que toda a autonomia que experimentamos no início da vida adulta, depois dos 18 anos, foi um Oásis. Pouco adiantaram as rebeliões dentro de casa, ou o choro de cólera..
No fim, até agradecemos termos sofridos limites físicos..
Na minha época eu invejava as crianças que podiam ficar na rua o tempo todo, depois os adolescentes que podiam madrugar e sair com quem quisessem...Todavia, muitos não voltaram para a casa ou voltaram mutilados pelo contato com a realidade..Uma premissa é sempre verdadeira: Não há piedade fora de nossa casa..
O filhiarcado foi uma tendência da década de 90 que mostrava que o filho poderia controlar a casa, mas não deu muito certo pois para governar algo é preciso de muito conhecimento e conhecimento exige experiência e experiência precisa de tempo..Em suma, tudo isso precisa de um outro quesito, a aprendizagem.
Brecht dizia "Do rio que tudo arrasta dizem que é violento, mas ninguém diz o quanto são violentas as margens que o reprimem".Nessa frase, o autor fala da política da década de 30, das fortes repressões que culminavam em tortura, exílio e morte..Nesse caso, existe o excesso de margens, mas a inexistência de margens é utópica para nossa espécie. 
Quando eu tinha 16, lia essa frase e pensava que meus pais eram opressores tirânicos pois eram as hediondas margens. Depois vi que haviam margens no trabalho, no coleguismo, na vizinhança e na política. Odiava as margens. Com 4 décadas de existência, agora penso que não haveria rio sem margens pois a água, livre, teria se evaporado..Ter margens foi a condição de sobrevivência do rio..
Chega um ponto na vida em que nós mesmos criamos nossas margens. Iremos nos auto-controlar, nos auto-domar, nos auto-limitar, do contrário, adoeceríamos e por conseguinte, seríamos excluídos..  
Um dia Francesco entenderá porque não pode colocar o dedo no interruptor, colocar qualquer coisa na boca e saberá que é importante para os que estão por perto..Até vamos tentando controlar o estresse dessa situação..  Nunca foi fácil ser um limitador de crianças.


Tela de Lasar Segall

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